domingo, 11 de dezembro de 2011

Do latim, anxietate


Usualmente, só recorremos ao dicionário para descobrirmos o significado de palavras até então ignoradas ou a correta grafia de determinado vernáculo.


Porém, uma viagem por este "celeiro de ideias vivas" para conhecermos o exato significado de palavras rotineiras, surpreendentemente, pode nos ajudar a compreender determinadas situações e sentimentos.

Hoje pela manhã, o medo, este substantivo masculino que, pelo léxico, consiste na "Perturbação resultante da idéia de um perigo real ou aparente", desembarcou nos meus sentimentos  para uma estadia que promete ser menos breve do que eu gostaria.


Às vésperas de minha primeira cirurgia médica, acordei neste domingo perturbado. O perigo de uma cirurgia, ainda que hipotético, mexeu com minha psique e com o meu corpo. O temor do negativo, a dúvida do novo, refletiram diretamente em meu estômago. É impressionante como a mente e o físico estão intimamente ligados.


Para não deixar esse sentimento negativo tomar conta, lembrei dos benefícios que irei auferir, caso a cirurgia seja bem-sucedida. Desde a mais simples atividade - como subir uma escada, até a mais complexa que já consegui desenvolver (jogar tênis), retornarão ao meu cotidiano que, justamente pela lesão, anda bem pouco emocionante.


Me enchi de esperança. 

Esperança! 

Corri para o dicionário e me deparei com uma definição simples, porém extremamente ilustrativa: "Aquilo que se espera, desejando."

Foi então que me indaguei: O que é capaz de produzir, alternadamente, medo e esperança? O que faz me angustiar com a chegada e, ao mesmo tempo, a desejá-la com veemência?

Pesquiso mais um pouco e encontro a palavra que pode responder esses meus dominicais sentimentos; Leio sua definição de acordo com a Psicologia: "Atitude emotiva concernente ao futuro e que se caracteriza por alternativas de medo e esperança". 


É isso! De novo, é a maluca da ansiedade!






quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim (1927-1994)

Rua Nascimento Silva, cento e sete
Você ensinando prá Elizete
as canções de canção do amor demais
Lembra que tempo feliz, ai que saudade,
Ipanema era só felicidade
Era como se o amor doesse em paz
Nossa famosa garota nem sabia
A que ponto a cidade turvaria
este Rio de amor que se perdeu
Mesmo a tristeza da gente era mais bela
e além disso se via da janela
Um cantinho de céu e o Redentor
É, meu amigo, só resta uma certeza,
é preciso acabar com essa tristeza
É preciso inventar de novo o amor
Rua Nascimento Silva, cento e sete
Eu saio correndo do pivete
Tentando alcançar o elevador
Minha janela não passa de um quadrado
A gente só vê cimento armado
Onde antes se via o Redentor
É meu amigo só resta uma certeza
É preciso acabar com a natureza
É melhor lotear o nosso amor



É um fato que tenho recebido reclamações de milhares de leitores sobre esses temas EMOs que nós, os autores, estamos produzindo.
Ocorre, no entanto, que ao tentar fugir para outro espaço deparei-me com a triste data de falecimento de Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, o nosso Tom. Buscando homenageá-lo, então, achei essa música que o não menos genial Vinícius de Moraes fez ao Tonzinho (como o chamava).
Extraio dessa letra a infeliz e já conhecida constatação de que o passado é sempre melhor...
Já foi tema, inclusive, de outros textos deste mesmo blog! Mas é inesgotável esse mote, por ser inesgotável esse sentimento.
Ao olharmos para trás tudo parece um sonho, partes ruins existem, mas tornam-se pequenas, distantes, nós acabamos virando heróis de nossas próprias histórias, sempre dá-se um jeito, arruma-se uma desculpa para que tenhamos agido de determinada forma em certo momento, "não tinha como ser de outra maneira", "era o melhor a ser feito", e então, resolvemo-nos conosco mesmos, uns com álcool, outros com drogas, outros com ajuda profissional, e os que sucumbem na depressão.
Há quem queira viver a vida ao máximo, cada instante, sempre e tudo. Com isso são muitos os arrependimentos que a frente surgem, então busca-se viver mais ainda para não se tenha mais deles no futuro! Quanta ilusão...
O fato do passado ser maravilhoso ou, no mínimo, melhor que o presente é fatalmente um recurso do nosso sub-consciente visando não sei a qual objetivo. Denegrir o presente? Glorificar o passado? Não sei, mas a psicologia deve ter alguma explicação (tentativa) para isso.
A magia está no único instante que pode ser mágico: AGORA! Por mais hedonista que essa "clichética" frase é, ela também é a mais pura realidade, ao menos aos que não têm muitas expectativas para o além-morte. Para esses a vida deve ser muito mais fácil...
Não quero me estender, a única ideia foi lembrar e singelamente homenagear o Maestro mais Brasileiro que tivemos, temos e sempre teremos!!!

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Somos os que Vamos

Image: Rene Magritte - Os Amantes (1928)



MONOGAMIA. Ao realizar a pesquisa sobre o assunto, para melhor produzir essa breve dissertação, deparei-me com um grande volume de informações, textos e artigos que se contrapunham as questões da vida monogâmica, indicando que o assunto anda meio desacreditado ultimamente. De uma forma geral a "defesa" da monogamia se reduzia a produções de forte cunho moralista como a igreja e o Direito. Portanto é, de certa forma um objetivo, analisar a questão nem como "mito", nem como "obrigação", mas focado nas questões funcionais e existenciais que emanam da questão.

Não por acaso a antropóloga Margaret Mead sustenta que a monogamia é "o mais difícil de todos os arranjos conjugais humanos". É também um dos mais recentes. A ideia da monogamia nasce junto com o turbilhão de ideias que brotavam no mundo ocidental no século XVII. Influenciados principalmente pelas ideias do Romantismo e do Iluminismo. Nesse contexto surge o casamento por amor (versão mais conhecida da sociedade ocidental contemporânea) um fenômeno absolutamente contemporâneo (de no máximo 1 século e meio), que praticamente recria a forma de viver em sociedade. Mesmo casais fiéis e juntos há muito tempo são novatos na monogamia, quer percebam ou não.

Ao tentarem manter um vínculo social e sexual que consista exclusivamente em um homem e uma mulher, esses indivíduos estão contrariando algumas das inclinações evolutivas mais profundas da biologia da maioria das criaturas, uma vez que apenas cerca de 4% das quase 5 mil espécies de mamíferos (incluindo os humanos) formam laços duradouros e monógamos. Evidência irrefutável de que a monogamia é a exceção no comportamento dos animais desse planeta.

Porém devemos compreender que o homem (homo sapiens), uma vez que se organizou e se desenvolveu tecnologicamente, criou uma série de hábitos que passaram a compor os impulsos e reações humanas da mesma forma que os determinados pela Biologia. É claramente o caso das relações monogâmicas, que ao contrário do comportamento das espécies, onde há uma observação mais consolidada há muito tempo, passou a ser estudada apenas a partir da década de1950 quando surgem os primeiros estudos sobre a instituição do casamento e da monogamia

Minha posição pessoal tende a sustentar que a espécie humana não é fisiologicamente monogâmica. Somos seres extremamente hedonistas e libidinosos. Em contraponto sustento que o ideal de monogamia não foi ainda testado por tempo suficiente para que possa ser considerado insatisfatório. Não é possível apontar uma melhor opção na dialética entre monogamia e poligamia sem incorrer em uma linha de moralismo ou canalhismo. Ambos são um dos muitos caminhos que devemos escolher ao traçar nossa trajetória na vida, sabendo que, nesse caso, é possível que caminhemos por ambas (por um pequeno período, naturalmente) as estradas antes de escolher em qual seguiremos.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Família

Titãs

Família! Família!
Papai, mamãe, titia
Família! Família!
Almoça junto todo dia
Nunca perde essa mania...
Mas quando a filha
Quer fugir de casa
Precisa descolar um ganha-pão
Filha de família se não casa
Papai, mamãe
Não dão nem um tostão...
Família êh! Família ah!
Família! oh! êh! êh! êh!
Família êh! Família ah!
Família!...
Família! Família!
Vovô, vovó, sobrinha
Família! Família!
Janta junto todo dia
Nunca perde essa mania...
Mas quando o nenêm
Fica doente
Uô! Uô!
Procura uma farmácia de plantão
O choro do nenêm é estridente
Uô! Uô!
Assim não dá pra ver televisão...
Família êh! Família ah!
Família! oh! êh! êh! êh!
Família êh! Família ah!
Família! hiá! hiá! hiá!...
Família! Família!
Cachorro, gato, galinha
Família! Família!
Vive junto todo dia
Nunca perde essa mania...
A mãe morre de medo de barata
Uô! Uô!
O pai vive com medo de ladrão
Jogaram inseticida pela casa
Uô! Uô!
Botaram cadeado no portão...
Família êh! Família ah!
Família!
Família êh! Familia ah!
Família! oh! êh! êh! êh!
Família êh! Família ah!
Família! hiá! hiá! hiá!...



Um dos conceitos etimológicos de família, extraído do dicionário aurélio, traz a seguinte redação: 11.Sociol. Comunidade constituída por um homem e uma mulher, unidos por laço matrimonial, e pelos filhos nascidos dessa união.

É impossível negar que esse é o conceito da família moderna, criada até meados do século XX, onde tanta coisa era diferente! Mas há ainda quem tenha esperança e essa visão, por mais improvável que possa ser, ainda pode ser...
E nada melhor para dar uma possível abertura a essa possibilidade do que uma gestação, se para Mário Prata 'filho é bom, mas dura muito', para Vinícius, com quem concordo pouca coisa mais: 'filhos, melhor não tê-los, mas se não os temos como sabê-lo?'. E penso que isso seja em relação a tudo em nossas vidas, como saber de algo antes de vivenciarmos? É impossível! E nisso sou tão empirista quanto é possível, nesse caso e aristotelicamente falando, nada há no nosso modo de ver o mundo sem que antes não tenha acontecido conosco, aliás há, mas sob outro império, o da ditadura intelectual que nos impomos sem antes termos vivenciado.
Pois bem, mas tornando à família... A par do antigo conceito e de toda mudança ocorrida em nossos tempos, temos todos (quase) essa figura de papai, mamãe e filhinho incrustados em nossas mentes e aqueles que, como eu, não veem o mundo dessa forma, são mal vistos. Esse conceito é como religião ao qual Arthur Schoppenhauer em um trecho de sua obra, transcrita em 'A Cura de Schoppenhauer' , diz ser até apelativo, pois não nos dá a opção, é arraigado em nossas mentes tão cedo que torna-se quase inato. Há quem discorde também.
Como dito, há ainda quem concorde, mesmo nos tempos atuais, onde a verdade é algo tão fugaz, que esse modelo patriarcal, onde o pai era um pouco o representante de deus, ainda esteja em vigor... Se um dia isso foi bom, não posso dizer, não podemos cobrar de um surdo a descrição de algum som! O que sei é que se com sentimento não se pode brincar, com a concepção de uma criança tão menos... é coisa séria, que traz bônus, os mais inenarráveis que são ditos, mas traz também sérios ônus, e que não se olvide que o vínculo é eterno e esse sim 'até que a morte nos separe'...

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Complementos incompletos...

"Os humanos se protegem da perda do ser amado evitando as peripécias e as decepções inerentes ao amor genital e, transformam esse amor num sentimento inibido quanto a sua finalidade, transformando esse amor exclusivo em amor pela humanidade. Mas todo amor que não escolhe, perde o seu valor, pois é injusto em relação ao seu objeto, e depois, porque nem todos os humanos merecem ser amados. Meu amor é algo infinitamente precioso, que eu não tenho o direito de desperdiçar sem prestar contas. Se amo um outro ser, de alguma forma ele tem que merecer. Ele o merece se é tão melhor que eu e me oferece a possibilidade de amar nele meu próprio ideal." (Freud)



Freud diz que já que os homens não podem viver só de amor, vão viver de trabalho e de sociedade também, mas para ele as mulheres seriam anti-civilizatórias porque elas gostariam de manter o ser amado perto delas ao passo que o ser amado quer ir para o mundo.
Por esse depoimento Freud fora taxado de machista e tudo mais possível, mas há a possibilidade de se interpretar essa frase de uma outra forma, com um pouco mais de humor, onde as mulheres adoram discutir a relação e os homens tem vontade de pular da janela cada vez que isso acontece...
Para além dessa imagem caricatural há um fundo de verdade, pois como foi ao longo dos séculos para os homens o laços sociais existiram de diversas formas, fazendo guerra, fazendo exército, vê-se que nem todos eram laços bons, mas para as mulheres não, elas talvez falassem a verdade sobre o amor.
O que Freud quer chamar a atenção é que nem o amor traz a felicidade e que o ser humano é dividido por essa pulsão de vida, que quer fazer laços cada vez mais amplos e por essa pulsão de morte, que faz com que o homem, retomando Hobbes, seja o lobo do homem, no fundo, portanto, há uma agressividade inata no homem, essa agressividade humana está no cerne do desejo e dá prazer ao ser humano, é ela que dá corpo à pulsão de morte a que Freud se referiu, que pode se manifestar de várias formas, na
agressividade contra o próximo, na violência sexual, na exploração do trabalho, exploração política, nas ditaduras, guerras, na violência social. Ela se reflete em tudo aquilo que se repete...

Esse é um trecho de uma palestra sobre a pós-modernidade que refere-se à família pós-moderna, cujo tema é Amor e Liberdade. Nessa palestra tem-se por principal figura Zigmunt Bauman, sociólogo polonês que talvez seja o grande nome dos tempos atuais!
O que mais me chamou atenção nisso tudo foi a parte onde Freud fala sobre o desperdício do amor... "meu amor é algo infinitamente precioso e eu não tenho o direito de desperdiçá-lo sem prestar contas".
A gente vive fazendo isso, né? Primeiro fazendo de uma outra pessoa o seu ideal, o que, em verdade, não depende de nossa razão, é algo que ultrapassa essa fina barreira. Amar o seu próprio ideal em outra pessoa seria bom? Porque daí, vejamos, se esse ideal erra, acaba-se por entrar-se em pane com seu próprio sistema e se você já não gosta tanto de si é porque o ideal não acompanhou tuas mudanças.
Teríamos desperdiçado um tempo formidável de nossas vidas com uma imagem que não era real? Penso que não... se desperdiçamos, e eu não concordo com essa palavra, é porque naquele momento isso nos convinha, de alguma forma isso nos fez bem, nos completou, aliás não, não nos completou pois não somos incompletos (dentro de nossa inexorável necessidade de completude), a palavra correta deve ser complementar, acrescentar.
Cada um complementa sua vida da melhor forma e quanto mais complemento, vivenciando Vinícius de Moraes, melhor é a vida... Já escolheu seu complemento?

terça-feira, 8 de novembro de 2011

I Just Call

Photo: V-J Day in Times Square (Alfred Eisenstaedt) - Para lembrar que a vida é a arte do encontro. Embora haja tanto desencontro pela vida.


Quando recebi o convite para colaborar com esse promissor espaço, animou-me a idea de que seria interessante ter (mais um) espaço onde fosse possível realizar um intercâmbio intelectual. Como o convite partiu de alguém que me conhece intimamente, imagino que meu anfitrião esteja consciente do hóspede que trouxe a sua casa...

Dito isso posso partir para a ação. O mote do momento parece tratar da análise dos relacionamentos afetivos humanos e suas vicissitudes calcadas pela impossibilidade humana em abandonar o que se chamou de egoísmo. Naturalmente o homem como ser mutante que é (mesmo os que não se pensam/vêem assim) se expressa na medida de suas experiências e momentos vividos. Assim sendo, não fujo a essa regra e por isso mesmo imagino que o tom de minhas ilações irá se contrapor aos apresentados por meus companheiros anteriormente.
As relações humanas vêm sofrendo transformações profundas e radicais nos últimos 60 anos (do pós-guerra até os dias atuais). Fixando a discussão apenas nas questões envolvendo a relação pessoal amorosa dos heterossexuais (Homem x Mulher) considero a falta (ou falha) de comunicação entre os parceiros o cerne da problemática encontrada. Nesse sentido discordo um pouco dos apontamentos, muito bem destacados, por meus colegas anteriormente.

Não acredito que esse "egoísmo" seja a causa dos desencontros atuais. Qualquer conclusão que tenha como premissa uma generalização é potencialmente equivocada. Não há dúvidas que todos somos, de alguma forma, mais ou menos egoístas. Mas se naturalizarmos e estendermos "erga omnes" esse egoísmo como sendo um sentimento único, acabaríamos por colocar no mesmo diapasão o indivíduo que pratica o egocentrismo mínimo e necessário para a sobrevivência com aquele que estaciona o carro na vaga de deficiente. Convenhamos que há uma grande distância entre os casos.

Sobre o assunto é necessário dizer que, ainda que sejamos auto-centrados e pouco solidários na vida cotidiana, poucas coisas tornam um indivíduo tão altruísta como o amor. Mesmo que seja por um breve momento, um novo romance é o momento perfeito para que realizemos aquela mudança que tanto tarda por acontecer, ou entrar em contato com aquele lado que você nem sabia ter. Mesmo considerando que o amor é em grande parte ilusão e idealização, não tenho dúvidas que o momento da paixão é mobilizador de intensas transformações do SER.

Para mim a grande dificuldade que o homem pós-moderno encontra nos relacionamentos afetivos começa pela desorientação em sua busca. A maioria dos homens que eu conheço busca pra si primeiramente uma mulher que seja obviamente bonita (ou de beleza óbvia). Um problema recorrente dessa fórmula é que, mulheres assim são geralmente autocentradas, caprichosas e frívolas. Soma-se a isso o fato de que a beleza é de todas as virtudes a mais efêmera e fugaz. Nesse caso em pouco tempo as dificuldades inviabilizam essa relação oriunda de uma percepção superficial da relação.

Outro ponto que ressalto com maior agudez é a falha na comunicação entre o casal gerada principalmente pela falta de clareza dos objetivos e das possibilidades dessa união. Isso se deve em grande parte devido a falta de honestidade com que as pessoas habituaram-se a agir. A ética na sociedade atual possui uma lógica mercantil que muitos indivíduos (a maioria) levam para dentro de suas relações pessoais (família, amigos, romances etc), sem considerar que nem sempre é possível realizar cortes, ou remanejamentos na vida afetiva. Aparentemente um amor bem sucedido é aquele em que todos os envolvidos se conhecem a ponto de reconhecer suas qualidades e suportarem seus defeitos.

Independente de crença, raça ou cultura todos os seres humanos querem ser amados. Mas quantos de nós está disposto a despir-se de suas máscaras ousando ser si mesmo diante do outro? Queremos algo que nós mesmos somos incapazes de dar.

Muitos são os aspectos que envolvem esta, que deve ser uma das mais antigas questões humanas. Portanto tanto seria impossível tratar do assunto sem ser superficial ou reducionista. Afinal em matéria de AMOR todos somos e sempre seremos eternamente aprendizes...

SENTIMENTO ALHEIO - PARTE II


Você está ficando afiado, caro "Nós".
Acontece que a descartabilidade, no sentido que você coloca, me parece ter mais relação com a forma de cada pessoa lidar com seus sentimentos, do que pelo conceito ordinário aplicado à espécie.
Ora, "deixar um pouco de si e levar um pouquinho de nós" exprime rigorosamente a mesma ideia de "deixar um pouco e levar um tanto". Se são apenas PARTES que vão e que vem, uma base sempre ficará - agora, se esta base é conceito ou essência, é só uma questão de nomenclatura.
Nesse sentido, o julgamento que fazemos acerca da descartabilidade, nada mais é que uma forma reducionista de constatarmos como uma pessoa lidou (aproveitando o caso citado) com a ruptura de um relacionamento, envolvendo-se, daí, inúmeras questões empíricas e existenciais – tantas que serviriam de base para uma só postagem.
E também em função deste fenômeno que concordo com o restante do texto, que, por sinal, de profundo conteúdo.
Nossos parâmetros de melhor e pior, de fato, não são universais - sendo mais claro, não podemos considerar a possibilidade de padrões “erga omnes”, sob pena de cairmos em dogmáticas que, notoriamente, restringem o pensamento humano.
Por sua vez, em relação ao egoísmo, de fato, talvez seja a mais marcante característica do ser humano – mas isso não quer dizer que sejamos todos vis. O egoísmo humano vai além da aplicação hodierna a ele depositada. O egoísmo, essencialmente, advém da questão de que TODAS as nossas ações são baseadas nos nossos interesses. Não sou um leitor de Nietzsche - na verdade, nunca li uma linha oriunda de um livro seu, porém, há algumas semanas assisti um Café Filosófico que, dentre outros assuntos, abordava o fato de que, tanto para ele quanto para Spinosa, a ação desinteressada não existe. Nas palavras do filósofo alemão, “existem ações interessadas interesseiras e ações interessadas não interesseiras, mas sempre existe o interesse”. Intimamente ligados (egoísmo e interesse), num primeiro momento relutei em aceitar esta (dura) realidade. No entanto, despindo-os de suas cargas negativas, aceitei o fato. Como brilhantemente cantou Raul e oportunamente lembrou “Nós”, o egoísmo, por vezes, nos faz agir de forma solidária – mas esta ação solidária não é a válvula propulsora do ato, mas sim, o fim obtido com ele, único e exclusivamente realizado para satisfazer um interesse.
Dessa forma, não sei se triste, mas tenho pra mim a constatação de que o respeito pelo sentimento alheio existe apenas enquanto nossos interesses convergem-se.

Sentimento alheio? OK!

(Tenho tanto sentimento)

Tenho tanto sentimento
Que é freqüente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.

Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.

Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.

Fernando Pessoa - Cancioneiro- 18/09/1933




Meu old, velho, cricket, incitou-me a escrever sobre esse assunto, qual seja, "a praticidade com o sentimento alheio". É certo que o mais novo integrante desse blog, meu irmão Zarageist, vai querer impor razões pela foto e tudo mais, creiam, leitores, essa foto só expressa a mais pura essência que há no mote em questão.
Pois bem, vejamos, ao entrar na vida de alguém, em 100% das vezes não nos ligamos com o que estamos movendo do outro lado, é claro que sempre buscamos mover para o melhor lado possível, no entanto, o parâmetro que se tem de melhor ou pior lado é aquilo que a vida nos deu, ou seja, buscamos dar o melhor de nós mesmos para conseguirmos fazer a outra metade, por assim dizer, feliz!
No final das contas o que vale é que todos, absolutamente todos os seres humanos são sujeitos egoístas, que ainda que se julguem altruístas, não o são, nos dizeres de Raulzito, para o qual 'o meu egoísmo é tão egoísta que o alvo do meu egoismo é querer ajudar', rá rá, esse sim tinha o conceito correto de egoísmo e da vida em torno do umbigo...
Retomando: Nós só fazemos aquilo que nos é bom, é a velha lei do custo-benefício, caso não nos interesse, uns mais facilmente, outros com um pouco mais de dificuldade, mas caso de fato não mais nos interesse, bye bye...
E é assim que nos envolvemos com o sentimento alheio, unicamente, no final de tudo, buscando a ajudar a nós próprios.
As pessoas não são descartáveis, é até um clichê dizer que cada um que passa em nossas vidas não sai sozinho, deixa um pouco de si e leva um pouquinho de nós, mas é exatamente isso. Nós não podemos e não temos o direito, por mais fácil e simples que seja, de mexer na gavetinha de sentimentos das pessoas, um dia pode ser a nossa, e ninguém é embalado à vácuo, não é mesmo?
Por uma outra leitura poder-se-ia dizer que sim: as pessoas são descartáveis! Deixam um pouco, levam um tanto, mas a base fica, alguns a chamam de essência, essa história vai longe...

sábado, 5 de novembro de 2011

“Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas,
que já tem a forma do nosso corpo,
e esquecer os nossos caminhos,
que nos levam sempre aos mesmos lugares.
É o tempo da travessia:
e, se não ousarmos fazê-la,
teremos ficado, para sempre,
à margem de nós mesmos.”
(Fernando Pessoa, Vida Simples, edição 53, p. 69)



(essa bibliografia que citei retirei da internet, pode estar errada, bem provável)
Mas, voltemos a Fernando Pessoa(será que esse poema é mesmo dele? encontro agora um site dizendo que essa é uma falsa atribuição a ele, enfim...), o que penso é que ele como tantas outras foram grandes almas sofredoras, como todas as almas superiores, por assim dizer, são! Superiores no sentido mais romântico da palavra, superiores por sentirem mais com a mente do que com o coração, (ou mais com o coração do que com a mente?), não consigo quantificar bem isso!
Os poetas, em geral, são, segundo essa definição (minha mesmo, rs), almas superiores, o próprio Fernando Pessoa escreveu, e esse é dele mesmo, que 'o poeta é um fingidor/finge tão completamente/que chega a sentir que é dor/a dor que deveras sente...' Ora, fingir uma dor e escrevê-la com tanta genialidade não pode ser coisa de uma alma medíocre.
Como esse texto está sendo escrito aos poucos, dias diferentes, saiu um pouco do contexto acerca da poesia da qual falava, volto, então!
Qual é esse momento da travessia? Existirá um só em nossas vidas? Penso que não... Penso que a cada passo que damos tomamos um rumo diferente que mudará de forma irreparável o futuro ("se em certa altura tivesse voltado para a esquerda em vez de para a direita..."), um respeitado (por mim) autor da atualidade, Gabriel, o pensador, fala sobre isso em uma música que me veio agora à mente, "Muda que quando a gente muda o mundo muda com a gente/A gente muda o mundo na mudança da mente/E quando a mente muda a gente anda pra frente/E quando a gente manda ninguém manda na gente!/Na mudança de atitude não há mal que não se mude nem doença sem cura/Na mudança de postura a gente fica mais seguro/Na mudança do presente a gente molda o futuro!"... O que passo a refletir é que essa questão que tanto me atormenta agora, atormenta muita gente, atormenta todos.
E isso vale pra tudo, né não? Para questões profissionais, para questões filosofais, para questões amorosas, para as políticas, e tantas outras...
Por um tempo experimentei não querer mudar nada e fazer da vida uma linha reta. Como vejo que fui inocente, inocente e ao mesmo tempo muito prepotente, quem somos nós para, em meio ao despertar da existência, querer regrar alguma coisa... O abismo tá aí, pulemos?

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Na Noite Terrível

Álvaro de Campos

Na Noite Terrivel

Na noite terrível, substância natural de todas as noites,
Na noite de insônia, substância natural de todas as minhas noites,
Relembro, velando em modorra incômoda,
Relembro o que fiz e o que podia ter feito na vida.
Relembro, e uma angústia
Espalha-se por mim todo como um frio do corpo ou um medo.
O irreparável do meu passado — esse é que é o cadáver!
Todos os outros cadáveres pode ser que sejam ilusão.
Todos os mortos pode ser que sejam vivos noutra parte.
Todos os meus próprios momentos passados pode ser que existam algures,
Na ilusão do espaço e do tempo,
Na falsidade do decorrer.
Mas o que eu não fui, o que eu não fiz, o que nem sequer sonhei;
O que só agora vejo que deveria ter feito,
O que só agora claramente vejo que deveria ter sido —
Isso é que é morto para além de todos os Deuses,
Isso — e foi afinal o melhor de mim — é que nem os Deuses fazem viver ...

Se em certa altura
Tivesse voltado para a esquerda em vez de para a direita;
Se em certo momento
Tivesse dito sim em vez de não, ou não em vez de sim;
Se em certa conversa
Tivesse tido as frases que só agora, no meio-sono, elaboro —
Se tudo isso tivesse sido assim,
Seria outro hoje, e talvez o universo inteiro
Seria insensivelmente levado a ser outro também.

Mas não virei para o lado irreparavelmente perdido,
Não virei nem pensei em virar, e só agora o percebo;
Mas não disse não ou não disse sim, e só agora vejo o que não disse;
Mas as frases que faltou dizer nesse momento surgem-me todas,
Claras, inevitáveis, naturais,
A conversa fechada concludentemente,
A matéria toda resolvida...
Mas só agora o que nunca foi, nem será para trás, me dói.

O que falhei deveras não tem sperança nenhuma
Em sistema metafísico nenhum.
Pode ser que para outro mundo eu possa levar o que sonhei,
Mas poderei eu levar para outro mundo o que me esqueci de sonhar?
Esses sim, os sonhos por haver, é que são o cadáver.
Enterro-o no meu coração para sempre, para todo o tempo, para todos os universos,

Nesta noite em que não durmo, e o sossego me cerca
Como uma verdade de que não partilho,
E lá fora o luar, como a esperança que não tenho, é invisível p'ra mim.




Daí que é o seguinte... Ao mesmo tempo que se pensa que no futuro arrepender-se-á de tudo que não foi feito, seria possível que não pensemos no presente? Estaria correto Schopenhauer ao dizer que 'um vida feliz é impossível. o máximo que se pode ter é uma vida heroica'!?
Por vezes penso que sim, por outras tantas penso que ele não passava de um louco, virgem e infeliz! Não sei como foi a vida sexual dele, rs, mas louco e infeliz tenho certeza que foi...
Mas a cada vez que leio esse poema mais me convenço de que Fernando Pessoa estava absolutamente certo - como se eu pudesse falar que um cara como esse possa estar errado - enfim, a cada nova leitura, e são tantas... mais tenho certeza disso tudo, de que as únicas coisas realmente mortas são aquilo que não vivemos, logo não sabemos como foram em sua hipotética existência!
É estranho porque daí dói, dói saber que precisamos viver tudo para que não nos arrependamos de nada, não penso que seja dor, desespero, essa é a palavra. Desespero-me em ter que viver tudo, e eu preciso, quem não precisa? Quem se acha bom o suficiente pra jogar no esgoto o único momento certo que se tem na vida?
O mesmo filósofo, cujos dizeres estou retirando de 'A Cura de Schopenhauer' e não por conhecê-lo de verdade, disse o seguinte: "A maior sabedoria é ter o presente como objetivo maior da vida, pois ele é a única realidade, tudo o mais é imaginação. Mas poderíamos também considerar isso uma maluquice, pois aquilo que existe só por um instante e some como sonho não merece um esforço sério." Putz, como eu o achei contraditório e como eu concordo em absoluto com toda essa contradição...
Quando se muda um pouquinho do presente mexe-se com todo o futuro, não é mesmo? Mas é isso, cadáveres, sonhos, realidade, verdades, mentiras, quem somos nós?