sábado, 14 de setembro de 2019

Tempos mais que modernos





Chaplin, quando encenou um dos mais clássicos filmes de todos os tempos, estava retratando as mudanças estruturais vividas à época. Era a Revolução Industrial dando os primeiros passos em direção ao abismo...
É evidente que a industrialização trouxe consigo uma infinitude de benefícios, mas trouxe, de outra banda, talvez aquela que seja a pior das consequências: a falta de empatia. Estudos desenvolvidos na Universidade de Stanford mostraram um declínio de 40% na empatia da população jovem nas últimas duas décadas. Não por outro motivo foi aceso um sinal de alerta com relação ao suicídio.
Isso se dá, em parte, pela falta de leitura no mundo atual. Refere-se, aqui, à leitura profunda, àquela capaz de envolver nossos sentimentos, não à rasa, à de limite de 180 (?) caracteres.
O que ocorre, todavia, é que os novos tempos, esses mais que modernos, nos levam, invariavelmente, a cair nas ciladas tecnológicas. Tem como ir em sentido contrário?
Ernest Hemingway, escritor norte-americano do século passado, provocado por um grupo de amigos, talvez inquietos com sua genialidade, aceitou um desafio a ele proposto, o de escrever um conto com apenas 6 palavras. Não só aceitou como fez um de seus melhores contos:

“For sale: baby shoes never worn.”
“Vende-se: sapatos para bebês nunca usados.”

Isso, a par de demonstrar a teimosia e comprovar a genialidade do ianque, atesta, dentre tantas outras coisas, o poder que a imagem tem no nosso cérebro (ou seria o poder que nosso cérebro tem de, ao mesmo tempo que cria uma imagem, também constroi um turbilhão de sentimentos?)
Bom, seja como for, a preocupação que urge nos tempos atuais é que essa falta de empatia tem ligação direta, inclusive fisicamente falando, com o esquecimento da leitura mais profunda. E, repise-se, há outra maneira?
Não há resposta pronta, tampouco correta, mas é fato que essa nova Revolução Industrial, a chamada Revolução 4.0, está aí e, como as anteriores, modificará sobremaneira a vida social como um todo.
Um dado que comprova essa avalanche a caminho, é o apresentado pelo Professor da Universidade de São Paulo, Dr. Paulo Feldmann, ao afirmar que segundo estudos de Streeck, na Europa, em 20 anos, se nada for feito, a taxa de desemprego atingirá 70% da população. No Brasil, ainda segundo Feldmann, em 1990, a quantidade de empregados no setor bancário era de 1.700.000, ao passo que hoje, em 2019, há menos de 300.000. O Professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas, Dr. Denis Maracci, no mesmo encontro fez o alerta que até 2030 70% dos empregos serão automatizados.
Ou seja, estamos vivendo uma dicotomia social, pois ao mesmo tempo em que é necessário, sob pena de exclusão sócio-econômica, que se atente aos avanços tecnológicos, é imprescindível que se recorra ao velho e esquecido hábito da leitura, sob pena de, controlando robôs, nos tornarmos um deles.
Esse é um texto sem conclusão, ao menos no que diz respeito aos dias vindouros, mas, como comprovado por Hemingway, os sentimentos, notadamente os alheios, tão esquecidos quanto o hábito da leitura, pode nos levar dos mais belos horizontes às mais profundas trevas.

sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Política econômica e sua estreita ligação com o mercado de trabalho brasileiro






O período que compreende os anos de 2003 a 2014 foi muito importante para a história econômica brasileira, notadamente até 2008.
Sabe-se que o período que antecedeu, com severas políticas neoliberais, conquanto tenha, a princípio, estabilizado a economia, com a implantação do Plano Real, ainda no Governo Itamar, deixou o País numa situação bastante difícil, cujo crescimento econômico fora de pouco mais de 2% ao ano.
Pois bem.
No período referido, a economia passou a crescer cerca de 5% ao ano.
Essa elevação no ritmo de crescimento teve impacto em várias áreas, a exemplo da geração de empregos, da redução da taxa de desemprego, melhoria da estrutura ocupacional e de rendimentos, aumento da proporção de ocupações sob a tutela da legislação trabalhista e, fundamentalmente, a grande redução da desigualdade social.
Além do crescimento econômico e, na verdade, consectário lógico dele, o mercado de trabalho brasileiro recebeu importantes impactos positivos, com uma política de valorização do salário mínimo, o já citado crescimento da fiscalização trabalhista, da atuação sindical, de políticas públicas voltadas à área social e do trabalho, entre tantos outros.
Um quadro que denota muito bem essa realidade é o primeiro, a seguir, mostrando a taxa de formalização do mercado de trabalho no Brasil; o outro estampa o volume de crédito livre para pessoas físicas no Brasil (em % do PIB):




É certo, por um lado, que desde 2003 a situação econômica mundial melhorou para os países emergentes, o que favoreceu sobremaneira a viabilização desses programas, mas não se pode desconectar essa melhora mundial da implantação brasileira de políticas sociais.
Com efeito, ao mesmo tempo que o cenário econômico mundial contribuiu para a melhoria nacional, não se pode olvidar que o crescimento brasileiro foi muito favorecido justamente por encontrar um cenário de expressivo aumento de ocupação, do emprego formal, das transferências de renda. Esse aumento do emprego formal ocorreu em quase todos os grupos de ocupação.
Nesse cenário, portanto, o crescimento econômico do período ocorreu com uma maior estabilidade monetária, com redução do patamar inflacionário, conduzindo a uma notável recuperação da renda média do trabalho, o que fez com que os impactos da crise econômica mundial de 2008 fossem menos sentido.
Embora em escala menor, foi inevitável que a crise mundial refletisse na economia do Brasil. O primeiro impacto foi uma contração abrupta e substancial da oferta de crédito, com grande incerteza sobre a solvência de alguns grupos, o segundo impacto ocorreu relativamente ao comércio exterior, devido à queda no volume de comércio internacional e à redução vertiginosa dos preços das “commodities” geradas pela recessão nos países avançados.
Ante essa crise internacional e seus efeitos na economia brasileira o governo Lula adotou uma política de combate a esses efeitos, mediante medidas expansionistas das áreas fiscal, monetária e creditícia.
Política essa que perdurou até o final de 2010, quando o governo Lula passou a adotar uma política macroeconômia mais restritiva.
Foi nesse cenário que Dilma começou seu governo, dando continuidade a essas medidas austeras, que logo viu o cenário mundial voltar a retrair, após uma breve recuperação.
Mesmo com uma série de percalços, o primeiro governo Dilma, findo em 2014, foi capaz de uma série de reformas estruturais, a exemplo da reforma da Previdência do setor público, com a criação da Funpresp, da reforma do sistema brasileiro de concorrência, a autorização para a criação do cadastro positivo de pessoas físicas junto ao sistema financeiro e a regulamentação da margem de preferência para produtos nacionais nas compras do governo federal.
O que se pode concluir, portanto, é que, levando-se em consideração o cenário econômico mundial, bem como todo o histórico anterior ao período ora relatado, é que enquanto houve políticas econômicas voltadas às áreas sociais, mormente a de geração de empregos, o país resistiu às crises enfrentadas. O que não ocorreu, todavia, com os períodos que sucederam...